EM ETERNA CONSTRUÇÃO

Feliz Natal, Hanuka, Krampusnacht, Kwanzaa, aniversário do Noam Chomsky, festa da iluminação de Buda! Feliz Festivus!

Gosto do Natal pela contradição da coisa. Porque é alegre por fora e melancólico por dentro ou às vezes, porque é decadente e desanimado na superfície e festivo no subtexto. E gosto pelo fator equalizador que ele tem principalmente na nossa sociedade ocidental fruto de uma colonização ocidental. Todo mundo é atingido de alguma forma. Luzes nas casas da vizinhança, CD da Simone, uva passa no arroz, panetone no mercado. Nem que seja porque não precisa trabalhar na semana do dia 25 ou pior, porque precisa ficar no plantão.

Este post é para celebrar o que quer que seja que você celebre no fim de ano e, se você é do tipo Grinch, que odeia tudo isso, cresça seu coração no mínimo três tamanhos ou, se não quiser, pode ir embora sem problemas.

A ideia, a pedidos, é compilar uma obsessão minha: filmes, episódios de séries, músicas de natal ou marginalmente relacionados a essa data e essa época. Dos filmes eu falo um pouco, das séries eu só seleciono meus episódios favoritos e álbuns, livros e jogos eu só listo mesmo. Aproveitem.

Sem mais delongas:

  1. CINEMA
  2. TV
  3. MÚSICA
  4. BÔNUS: LIVROS E VIDEOGAMES


CINEMA

Para não fazer desta uma lista interminável e aleatória, vou dividir os filmes que acho essenciais de Natal em alguns blocos. Não são TODOS os filmes de natal que eu gosto, mas os que eu considero os melhores para quem quer ver coisas do gênero. Paralelo a isso, vou deixar aqui o link de uma lista maior e mais caótica no meu letterboxd, onde é possível filtrar as coisas, encontrar notas, críticas e onde assisti-las. Aqui.

https://www.themoviedb.org/t/p/original/wqgZSvgoctaadgwUdPYVsksivxn.jpg

do cinema mudo à Hollywood clássica

Santa Claus, George Albert Smith, 1898 | Mais aqui pela curiosidade, não sei muito do contexto do filme. Mas é historicamente considerada a primeira aparição do Papai Noel em um filme. É um curta de um minuto cuja sinopse o descreve completamente “Papai Noel chega na véspera de Natal em uma casa para entregar presentes”. Do que mais chama atenção formalmente, as truncagens de mudança de dia pra noite e a roupa do Papai Noel. Uma túnica bem bonita com mangas de sino. Veja ele no Youtube.

Em busca do ouro, Charlie Chaplin, 1925 | Embora Natal não seja esse o mote do filme, Chaplin aqui, partindo já para uma “comédia de inverno” por assim dizer, faz uma de suas melhores comédias (pra mim a melhor), lidando com a coisa da ganância e da busca eterna pela riqueza entranhada na América ambientando tudo em um período festivo de fim de ano. E com uma cena maravilhosa dele comendo um sapato inteiro.

A loja da esquina, Ernst Lubitsch, 1940 | “O privilégio de trazer James Stewart para o centro é o que aprofunda tudo. Num filme tão agridoce em seus momentos mais pesados, o ator consegue dar conta de uma dignidade ora engraçada, ora trágica de um personagem solitário. Orgulhoso do próprio trabalho, que se apaixona por alguém que ele não conhece e que acaba se complicando nessas relações tão simples.” (crítica do filme)

The curse of the cat people, Robert Wise + Gunther von Fritsch, 1944 | Nem de perto um filme com o alcance e o brilho que Sangue de Pantera (Cat People, 1942), mas a partir dessa premissa um tanto perturbadora, de Natal, essa continuação coloca os traumas passados como fantasmas que pairam sobre a nova família da protagonista perturbada do filme anterior. Trazendo à tona uma ideia de maldições hereditárias e um peso para a ideia de família na data. Estreia na direção do grande Robert Wise.

A felicidade não se compra, Frank Capra, 1946 | Arte é o que as pessoas fazem dela. Não por acaso então, é considerado o maior clássico de Natal de todos os tempos. Um melodrama de Capra preciso, equilibrado, apaixonante. Fracasso no cinema mas que é o que é pelas reprises televisivas e por um filme que usa ao máximo de seu poder de dramaturgia e de seu elenco para lidar com uma mensagem atemporal de como uma comunidade pode tudo quando se junta para um objetivo comum. O filme de banqueiro mais comunista do mundo.

Tudo que o céu permite, Douglas Sirk, 1955 | Falando em melodrama, o rei do gênero, Douglas Sirk, já mais de uma vez fez filmes que se passam durante as festas de fim de ano. Neste, que se desenrola no período, uma viúva rica se apaixona pelo seu jardineiro muito mais jovem. Chocando seus vizinhos e familiares. Poderia ser uma novela do Maneco, mas é um dos melhores romances de todos os tempos. E um dos filmes mais visualmente exuberantes dessa lista.

cinema moderno, 1960s e 1970s

Se meu apartamento falasse, Billy Wilder, 1960 | Talvez, talveez, o meu “filme de natal” preferido de todos os tempos. Wilder, Jack Lemon e Shirley MacLaine numa comédia romântica melancólica sobre a opressão da vida operária metropolitana filmado em Panavision parece sonho mas é realidade e é não só dos melhores filmes de Natal, desse gênero, dessa época mas de todos os tempos mesmo. Um absurdo.

Blast of silence, Allen Baron, 1961 | De um gênero seco e misantropo tipo é o cinema noir, a partir de um enredo niilista, sai um filme mínimo, bruto, rudimentar, quase, sobre um assassino de máfia que odeia a cidade, odeia o Natal, odeia as pessoas e precisa passar por pessoas curtindo o Natal na cidade para executar um serviço. Pontuando tudo por uma narração de fluxo de consciência que se contrasta com as ruas enfeitadas.

Os guarda-chuvas do amor, Jacques Demy, 1964 | Dos melhores musicais do mundo, até aceito a argumentação de que não é um filme propriamente “de natal”. Até porque ele termina lá depois de uma história que leva literalmente anos pra acontecer. Um romance entre dois jovens de Cherbourg frustrado pela guerra. Mas a cena final é um resumo formal e dramático tão pungente do que é esse filme que eu sempre considerei uma das melhores “coisas de Natal”que o cinema já produziu. Quase nada é tão bonito quanto a melancolia de Catherine Deneuve em frente a um pinheirinho em uma noite de nevasca.

Como o Grinch roubou o Natal, Chuck Jones + Ben Washam, 1966 | É um curta-metragem / especial feito para a TV exibido em 18 de dezembro de 1966 na CBS. Inspirado em um livro infantil de Dr. Seuss sobre a criatura que odeia o Natal e a felicidade sem razão particular. Mas o que tem de especial aqui é o casamento do maior gênio da animação Chuck Jones com esse material e a interpretação vocal de ninguém menos que Bóris Karloff. Fora isso gerou uma das minhas músicas de natal favorita que é You’re a mean one, Mr. Grinch. Eu falei sobre essa e as outras versões do livro no podcast do Pinguim Dançarino.

A conversação, Francis Ford Coppola, 1974 | Aqui já num terreno de: “se você não prestar bem a atenção nem percebe que tá rolando o Natal no fundo das cenas”, acho que é um filme que se encaixa muito na definição mais ampla de “filme de Natal” muito por conta dessa construção minuciosa desse que deve ser um dos personagens mais solitários do cinema. Em uma obra-prima completa de Coppola. Com uma das melhores trilhas sonoras da história. Existem poucos filmes perfeitos. Esse acho que é um deles.

Noite do terror, Bob Clark, 1974 | É o que a gente consideraria hoje um slasher bem tradicional. Filme canadense sobre assassinatos de um grupo de garotas em uma fraternidade feminina de uma universidade durante o feriado natalino. Muito inventivo em termos de decupagem e na forma como o assassino usa o telefone como um elemento quase de anunciação da morte. Bem divertido. Faz um bom par com Slumber Party Massacre de cinco anos depois, de Amy Holden Jones. (que não é de Natal, no caso).

blockbuster cinema dos anos 1980

Fanny e Alexander, Ingmar Bergman, 1982 | No sentido tradicional da ideia de um filme de Natal como um registro de um tipo de melodrama familiar, Fanny e Alexander deve ser uma das maiores obras-primas desse “subgênero”. Feito como filme e como minissérie para a TV sueca como Cenas de um casamento, aqui Bergman fala de dois irmãos de uma família que passa por muita mudança em muito pouco tempo. É filme de amadurecimento, de família, de Natal tudo junto. Lindo. Se puder, busque a versão mais longa.

Furyo: em nome da honra, Nagisa Ôshima, 1983 | Sim. É o David Bowie! E o Ryuichi Sakamoto! Interpretando um oficial britânico e um japonês em um drama de prisioneiros de guerra pautado por um subtexto homoerótico entre o carcereiro e encarcerado. Um filme que reflete ao mesmo tempo um calor e uma rigidez comportamental. Marcante pela intensidade que prevalece domesticada pelos modos dos personagens.

Gremlins, Joe Dante, 1984 | Escolha manjada de cinema de Natal que meio que todo mundo já viu e meio que todo mundo conhece e lembra porque é fofinho, divertido e caótico. Mas é essa única parte que mais chama atenção pra mim sempre. O talento de Dante como arquiteto da anarquia e a violência intrínseca de tudo. Dos ataques dos bichos até da história escabrosa que a menina conta casualmente sobre a morte do pai queimado vivo numa chaminé.

Máquina mortífera, Richard Donner, 1987 | Apesar de ser um sucesso inegável, dá pra dizer que historicamente ele enquanto “ação de Natal” é meio ofuscado pelo Duro de matar que veio um ano depois. Ainda assim, vale muito não só a lembrança mas o abraço num filme que se orgulha do que é. Unindo um aspecto dramático muito sutil do personagem de Gibson a um filme que no todo sabe que é meio tolo. O auge sendo o momento em que um policial decide resolver as coisas numa briga de rua sem armas e todo mundo concorda ao redor.

Duro de matar, John McTiernan, 1988 | Falei lá em cima que A Conversação é perfeito né? Então, Duro de matar também é. O filme perfeito de ação. Tudo funciona. Uma orquestração invisível (na verdade muito visível) de McTiernan para fazer um dos grandes exemplos da gamificação na ação cinematográfica entes mesmo desse conceito existir e ser de fato estudado. Um homem comum contra uma organização terrorista buscando reconquistar a esposa. Vivido por um dos maiores atores do mundo. Perfeito.

Férias frustradas de Natal, Jeremiah S. Chechik, 1989 | Terceiro filme de uma “quadrilogia” que dessas que foi meio longe demais dos anos oitenta, que de alguma forma é a melhor coisa da franquia enquanto funciona meio que de uma forma completamente isolada. É a mãe de todas as comédias natalinas de família americana e merece ser respeitada e abraçada por esse título. É imperfeito. Tem seus esqueletos que não envelheceram muito bem no âmbito cultural. Mas tem o timing, a comédia, os diálogos e o elenco perfeito pra ser tratada como fundamental.

cinema pós-moderno, 1990s

Esqueceram de mim, Chris Columbus, 1990 | Aqui fica a indicação para os dois, na verdade. Esqueceram de mim 1 e 2 são a síntese do que foi a comédia natalina noventista. Isto é. Uma domesticação de uma comédia americana mais selvagem que vinha da década anterior. Ultra consumista mas ultra consciente disso. Familiar. Aconchegante. E aqui, com um dos maiores intérpretes mirins do mundo e um diretor ‘ok’ mas que brilha quando quer, é daqueles casos onde tudo se encaixa. Que época pro Joe Pesci né…

Edward mãos de tesoura, Tim Burton, 1990 | Grande proponente de um cinema de fantasia levado muito a sério e com muito carinho, essa fase pré-CGI de Tim Burton na década de 90 rendeu muita coisa boa. Aqui, com um conto sobre um homem inacabado que se apaixona e termina no Natal é das coisas mais bonitas da década. E a cena em si de Edward fazendo “nevar” sobre Winona é uma das minhas imagens preferidas do cinema de natal. É doce, é esquisito, deixa o coração quentinho. (Burton pós-CGI é bom também)

Batman: o retorno, Tim Burton, 1992 | Melhor filme do Batman, um dos melhores de super-heróis e também um filme de natal sobre pais e filhos cheio de sátira política e uma sensualidade comedida. Dez anos antes do diretor fazer body horror pra crianças com Fábrica de Chocolate aqui ele já plantava a sementinha do BDSM para os pequenos com a Mulher Gato de Pfeiffer. Crítica que escrevi às vésperas da estreia de The Batman.

O estranho mundo de Jack, Henry Selick, 1993 | Percebem um padrão? Criado por Tim Burton embora dirigido or Henry Selick, é uma dessas animações de stop moton que não tem medo de traumatizar uma criança ou outra em prol de um filme que respeita a capacidade desse público de sentir coisas que nem sempre se repetem em desenhos de estúdios. Jack quer trazer o Natal para a cidade do Halloween. E nesse processo passa por uma quase crise de identidade.

Los Angeles: cidade proibida, Curtis Hanson, 1997 | Um filme que une duas paixões minhas. Meu subgênero favorito, o film-noir, em um filme revisionista mas muito reverente de Curtis Hanson. Que traz consigo uma metalinguagem quando aborda uma história hollywoodiana sobre mulheres que passam por procedimentos para se tornarem estrelas do cinema clássico. Durante o Natal. E com um elenco espetacular inclusive pelo falecido Kevin Spacey. Tem gente que acha que merecia mais o Oscar de 98 que Titanic. (não merecia mas é um filmaço)

Mens@gem para você, Nora Ephron, 1998 | Dos QUATRO filmes bem natalinos que Nora Ephron fez na década de 1990, este remake de A loja da esquina (volte 19 filmes) é uma das melhores comédias românticas da época. Tom Hanks e Meg Ryan como livreiros rivais que se apaixonam pelo chat sem se conhecerem e que, no Natal, se dão conta um do outro. É tudo o que você precisa agora. Meg Ryan, Tom Hanks, Nora Ephron e a Nova York hollywoodiana dos anos 1990.

De olhos bem fechados, Stanley Kubrick, 1999 | O último filme de Stanley Kubrick. O filme que supostamente terminou com o casamento de Tom Cruise e Nicole Kidman. Uma “odisseia sexual” como chamava o SBT. Mas na realidade, uma obra-prima sobre casamento, insegurança masculina e classe. Que começa quando um médico encontra um colega em uma festa de Natal e se desdobra para uma jornada onírica de um homem que quer muito pertencer a um lugar que não quer aceitá-lo. Falamos dele no Sábado sem legenda.

anos 2000

Um homem de família, Brett Ratner, 2000 | Brett Ratner não é lá essas coisas. Do tipo que quando acerta parece que é sem querer. Aqui nessa versão invertida de Felicidade não se compra é meio isso. Um filme que surpreendentemente singelo sobre um homem solitário que acha que tem tudo mas que na verdade não tem nada. Que na véspera de natal tem um vislumbre de como seria ter uma família. Veículo para um Nicolas Cage que muita gente gosta de esquecer, graciosamente indo do cômico ao dramático sem o menor esforço.

O diário de Bridget Jones, Sharon Maguire, 2001| Mais uma comédia romântica, mas essa uma bem tipicamente dessa nova década. Baseada em um livro de comédia romântica sobre uma personagem independente e romântica que trabalha com comunicação. Que calha de ser uma bela adaptação pós-moderna de Orgulho e preconceito e se passa entre dois natais. Jovens nunca vão entender o tamanho do que significa Renée Zellweger, Colin Firth e Hugh Grant num triângulo amoroso.

Gangues do gueto, Abel Ferrara, 2001 | Um filme de Natal de Abel Ferrara já devia ser uma definição indicativa do que é Gangues do gueto ou ‘r xmas no original. Mas vale dizer que, à luz dos pisca-piscas, esse é um dos dramas criminais mais duros e minimalistas desse início de século. Um homem envolvido com tráfico precisa negociar um resgate da esposa e filha sequestradas na véspera de Natal. Sendo no fim um filme meio filosófico sobre escolhas. A presença de Ice T como um traficante só dá ao filme mais uma camada para os fãs de Law and Order.

Simplesmente amor, Richard Curtis, 2003 | Dos filmes que eu mais revi na vida (todo ano abrindo a maratona de natal) e dos que eu mais escrevi sobre, Simplesmente amor era uma comédia espetacular quando lançado em 2003 que desde então vem se alternando entre revisão e re-revisão para que o mundo decida se é ou não super problemático. Ele é em alguns pontos. Colin, o personagem que quer vir par a américa sendo um deles. Mas fora isso, é tudo o que Richard Curtis pode alcançar enquanto realizador. E o filme de elenco definitivo. Com histórias marcadas por uma melancolia natalina e guiadas pela ideia do amor como algo inevitável. Filme lindo.

Padrinhos de Tóquio, Satoshi Kon, 2003 | Remake de um filme do John Wayne que era remake de um filme de Lewis Stone de 1936, é um dos grandes filmes de um dos melhores animadores do mundo, Satoshi Kon. Sobre três pessoas em situação de rua que encontram um bebê no lixo e procuram os pais da criança numa gélida véspera de Natal de Tóquio. É um filme sobre uma família disfuncional a seu modo mas é também um filme sobre gente invisível em um país de gente que tem mais dificuldade ainda de se expressar sobre suas questões sociais. É lindo. Formalmente também.

Beijos e tiros, Shane Black, 2005| Obcecado por feriados, Shane Black sempre escreve seus roteiros ambientados no Halloween ou no Natal. Em Beijos e tiros, ele faz um pastiche de cinema noir sobre um ladrão disfarçado de ator interpretado por Robert Downey Jr, um detetive interpretado por Val Kilmer e uma atriz vivida por Michelle Monaghan. Envolvidos em um caso de uma mulher desaparecida na época de Natal em Los Angeles. Black quando quer é um gênio de comédia absurdista que une uma coisa pastelão muito física a roteiros quase surreais.

Um conto de Natal, Arnaud Desplechin, 2008| Manifestação de uma das maiores tradições natalinas que é a da família disfuncional reunida à força, Um conto de Natal parte de uma matriarca odiada pelos filhos e que odeia os filhos reunindo a família no Natal porque precisa de um doador compatível de medula óssea. Tem Catherine Deneuve num dos melhores papeis dessa fase mais velha dela e Mathieu Almaric como a ovelha negra de família de párias. Filme sobre traumas e sobre como eles fazem a gente ser quem a gente é.

anos 2010 e 2020

Trabalhar cansa, Marco Dutra & Juliana Rojas, 2011 | Tem mais brasileiros na lista completa do Letterboxd. E filmes mais ‘natalinos’ que esse que só tem uma cena chave durante a festa de Natal. Mas é um dos grandes filmes desse terror paulistano dos anos 2010. Que fala de um casal que decide comprar um mercadinho que parece de muitas formas amaldiçoado. O suspense e as sensações ruins do local se tornam de algum jeito manifestações das complicações de dinâmicas de classe. Dos melhores filmes nacionais dos últimos 15 anos.

Tangerina, Sean Baker, 2015 | Cronista de pessoas invisibilizadas, Sean Baker fez um barulhão em Sundance 2015 com esse drama sobre duas prostitutas trans que vão atrás do ex-namorado e cafetão de uma delas numa véspera de Natal. Um filme sobre um lado pouco visto e pessoas ignoradas de Los Angeles. Lindo por diversas razões. Uma delas, por ter sido filmado integralmente em iPhones 5s, o que dá ao filme mais ainda esse tom de algo fora do padrão tanto para a forma quanto para o enredo.

Noite sem fim, Jaume Collet-Serra, 2015 | Melhor diretor de Liam Neeson do mundo, Jaume Collet-Serra fez em 2015 esse filme que deveria se unir ao panteão dos filmes de ação de natal logo abaixo de Máquina Mortífera e Duro de Matar. Sobre um bandido que mata o filho do outro numa confusão e sobre a correria noturna que acontece a partir disso. Tem um uso inacreditável de CGI num vai e vem do mapa de Manhattan e uma das melhores perseguições de carro recentes. Tão bom que nem a presença de Common estraga.

Carol, Todd Haynes, 2015 | Como não poderia deixar de ser, se tem Douglas Sirk na lista de Natal, tem que ter também o seu maior seguidor, portador do melodrama atualmente, Todd Haynes. Que adapta aqui um livro clássico de Patricia Highsmith sobre um romance proibido nos anos 1950 entre uma mulher casada Cate Blanchett e uma vendedora de loja de departamentos e fotógrafa Rooney Mara. O Natal usado como época para vislumbrar a possibilidade de uma vida que nunca vai poder ser vivida de fato.

Alguém avisa?, Clea Duvall, 2020 | “Happiest Season esconde por um jogo de expectativas e por uma série de situações cômicas (que podem até soar burocráticas, de vez em quando) algo mais profundo. Mais pesado, até. Autenticidade que, por mais que tentássemos circular e buscar outros motivos e razões, vem da vivência (de Clea Duvall). Afinal, como diz única linha da sessão ‘Personal Life’ do verbete sobre a atriz e diretora do Wikipédia: ‘DuVall is a lesbian’.” Crítica completa do filme que escrevi à época do lançamento.

Spencer, Pablo Larraín, 2021 | Larraín ou “La Ruim” para alguns é dos diretores populares mais irregulares trabalhando atualmente mas que aqui acerta muito no equilíbrio entre seus impulsos visuais e sua obsessão por personagens sofridas do mundo real. Um filme sobre a solidão de Lady Di em algum Natal pouco antes de morrer tragicamente. Que traz para a ótima atuação de Kristen Stewart elementos de terror que funcionam muito bem para um filme que emula uma fábula sobre uma princesa presa em uma maldição. Crítica no blog e no letterboxd.

Os rejeitados, Alexander Payne, 2023 | Clássico de Natal mais jovem dessa lista e melhor coisa que Alexander Payne faz em mais de uma década, The Holdovers é sobre três personagens que de algum jeito foram deixados pra trás. Em um filme que parece simular um aspecto setentista mas que vai muito longe com algo que a princípio parece só um esteticismo. Lindo. Uma das melhores atuações da vida de Paul Giamatti e um dos melhores usos de ‘The most wonderful time of the year’. Crítica no blog e no letterboxd.

filmes de ano novo

Aqui o primeiro apêndice. Filmes de ano novo. Muitas vezes marcados por um aspecto decadente das decorações de Natal depois da data passada. Nessa lista, filmes com cenas chave no réveillon.

Crepúsculo dos deuses, Billy Wilder, 1950 | Falando em decadência, talvez esse seja um dos maiores filmes sobre decadência da história do cinema. E que tem uma cena chave sobre isso quando William Holden e Gloria Swanson dançam no último dia do ano em uma festa esvaziada em uma mansão que mais parece um mausoléu. Obra-prima do cinema noir e um dos melhores filmes sobre Hollywood.

Harry & Sally: feitos um para o outro, Rob Reiner, 1989 | Ambientado ao longo de vários anos mas marcado pela obsessão da roteirista Nora Ephron em retratar feriados, esse que é conhecidamente uma das maiores comédias românticas, quiçá a maior, já feita, tem uma cena chave na véspera de ano novo. Quando Harry e Sally se veem na contagem regressiva repensando a própria vida. Um momento de virada da relação dos personagens.

Lua de fel, Roman Polanski, 1992 | Mais decadência, num dos filmes mais amargos de um dos diretores mais amargos da Nova Hollywood. Um filme que é sobre casamentos iniciando e acabando e a frustração do matrimônio quando opõe um casal jovem com um mais velho em um cruzeiro “romântico” que no fim serve só para explorar o aspecto patético do personagem de Hugh Grant. Culminando na clássica cena de todos felizes numa contagem regressiva emoldurando alguém miserável no centro de tudo.

Estranhos prazeres, Kathryn Bigelow, 1995 | A grande obra prima de Bigelow e uma das melhores coisas já feitas sobre a violência policial que amaldiçoa Los Angeles e os EUA desde sempre, o filme parte de uma especulação de ficção científica sobre uma tecnologia que deixa as pessoas viciadas em viver o passado para fugir do presente. Mas que é na verdade sobre uma sociedade doentia na beirada de uma virada de século. O ano 2000 na época era um futuro próximo.

Assalto à 13ª DP, Jean-François Richet, 2005 | Pecado meu nunca ter visto o original, de Carpenter, que por si já é um remake de um filme do Hawks. Mas fato é que esse remake de Assalto à 13ª DP de Jean-François Richet é um filme de ação bem divertido sobre um plantão em uma delegacia que será invadida por criminosos durante uma nevasca da véspera da virada de ano. E tem um elenco incrível, com Ethan Hawke, Laurence Fishburne, Maria Belo, Drea de Matteo e John Leguizamo.

filmes religiosos (cristãos)

Mesmo ateu, eu nunca deixei para trás minha obsessão de criança católica por filmes sobre histórias bíblicas e sobre a figura de Jesus Cristo e as muitas formas de tentar retratá-lo quase sempre pisando em ovos mas às vezes superando isso tudo. Pra quem gosta, finalizo as indicações de filmes com alguns retratos da “maior história já contada”. Sinto muito que não tenha encontrado nada sobre Hanukkah e outras datas da época. Se conhecer alguma, deixe nos comentários a dica. 🙂

Ben-hur, William Wyler, 1959 | Judah Ben Hur, mais um herói judeu que um personagem do cristianismo, tem muitas versões para o cinema. Desde a fase muda até a era do épico digital muito recente. Mas pra mim a melhor é ainda o ultrasucesso de William Wyler de 1959. Recordista de Oscar com 11 indicações que foram igualadas depois mas nunca superadas e que tem na sua trama um punhado de encontros do herói com uma figura interessante de Jesus Cristo que a gente nunca vê claramente a não ser por seus atos de bondade. É também um filme clássico sobre o uso de uma carga homoerótica muito forte na relação do protagonista com o seu rival, Messala.

O evangelho segundo São Mateus, Pier Paolo Pasolini, 1964 | A versão comunista definitiva de Jesus Cristo. Pasolini, comunista gay e perseguido por isso, faz desse um filme sobre principalmente os discursos e a atuação política de Jesus Cristo. Mais que filho de Deus ou homem santo ele é homem. Humano. Líder de um grupo que em um mundo de opressão busca pela palavra unir as massas. E tudo sob um minimalismo seco de Pasolini que se faz gigante no resultado final.

Jesus Cristo Superstar, Norman Jewison, 1973 | Contado meio que a partir da perspectiva de Judas, é uma versão para um cinema de uma peça musical de sucesso que surge de um álbum conceitual. Que dá à história de cristo uma versão muito enérgica não só por ser musical mas por ser um musical de Rock numa época que o Rock era realmente um gênero anti sistema e interessante como manifestação cultural. No filme, vale destacar a construção visual pra além disso. Principalmente nos figurinos e nos aspectos anacrônicos que fazem de Jesus e seus apóstolos hippies.

A vida de Brian, Terry Jones, 1979 | Há quem considere desrespeitoso o que pode ser, tá tudo bem, mas A vida de Brian, que não é sobre Jesus, mas sobre Brian da Judeia, que nasceu e morreu no mesmo dia que Jesus Cristo, é no fim uma das melhores comédias dos anos 70 e um conjunto maravilhoso de sátiras sobre os clichês de épicos bíblicos. Auge de Monty Python no cinema e que termina triunfante com Always look on the bright side of life.

A última tentação de cristo, Martin Scorsese, 1988 | As instituições e igrejas cristãs adoram dizer que Jesus Cristo é um ser humano antes de tudo mas odiaram quando o católico Martin Scorsese adaptou um livro sobre a humanidade de Jesus Cristo. Super polêmico, banido e o escambau, o que esse filme de mais desrespeitoso é ousar dizer que, se Jesus era um ser humano, ele pode ter tido as mesmas fraquezas e impulsos humanos que a gente tem. Da luxúria ao sonho de uma vida normal ao lado de Madalena na cena da crucificação.


TV

Sem a exploração de episódios individuais ou algo assim, aqui eu quero só indicar não séries natalinas mas séries que tem grandes episódios de Natal.

comédias

Seinfeld:
T3E12: The red dot
T4E13: The pick
T6E09: The mom and pop store
T6E10: The race
T7E10: The gum
T8E10: The Andrea Doria
T9E10: The strike (episódio do Festivus)

Os Simpsons:
Não vou listar todos os episódios de natal de Simpsons, que tem mais de trinta temporadas, mas indicar o piloto da série “Simpson’s roasting on an open fire”, que é também a origem do cachorro da família, Ajudante de Papai Noel.


Frasier:
T1E12: Miracle on 3rd or 4th street
T3E09: Frasier Grinch
T5E09: Perspectives on Christmas
T6E10: Merry Christmas, Mrs Moskowitz
T7E11: The fight before Christmas
T8E08: Mary Christmas
T10E10: We two kings
T11E11: High Holidays
Reboot T1E10: Reindeer games

The Office (US):
T2E10: Christmas party
T3E11+12: A Benihana Christmas
T5E11: Moroccan Christmas
T6E13: Secret santa
T7E11+12: Classy Christmas
T8E10: Christmas wishes
T9E9: Dwight Christmas

Community:
T1E12: Comparative religion
T2E11: Abed’s unconfortable christmas
T3E10: Regional Holiday Music
T4E10: Intro to knots

Veep:
T5E7: Congressional ball
T5E8: Camp David

Atlanta:
T3E2: Sinterklaas is coming to town (Perturbador e meio genial como toda a série. Tem blackface)

Marvelous Mrs Maisel:
T1E8: Thank you and good night
T2E6: Let’s face the music and dance (ep de Hannukkah)
T5E1: Go forward



Ted Lasso:
T2E4: Carol of the bells


O ensaio:
T1E5: Apocalypto (Genial. Mas é bom ver todos antes de chegar nesse).

dramas


Arquivo X:
T5E6: Christmas carol
T6E6: How the ghosts stole Christmas


Família Soprano:
T3E10: To save us all from Satan’s power
T3E11: Pine Barrens (pós natal, quando Paulie e Christophers se perdem na neve)
T5E13: All due respect (Fim de temporada, que termina com Tony fugindo do FBI da casa de Johnny Sack. Não se cita o Natal mas está rolando no plano de fundo)


Gilmore Girls:
T2E10: The bracebridge dinner
T3E10: Tha’ll do pig
T4E11: In the clamor and clangor
T5E11: Women of questionable morals
T7E11: Santa’s secret stuff

A sete palmos:
T1E1: Pilot (A série começa na véspera de Natal)
T2E8: The most wonderful time of the year

Mad Men:
T3E13: Shut the door have a seat (season finale incrível onde uma nova agência surge durante um feriado de Natal)
T4E02: Christmas comes but once a year
T5E10: Christmas waltz
T6E01+02: The doorway

Bojack Horseman:
Especial de Natal: “Sabrina’s christmas wish”

Servant:
S2E9: Goose

Normal People:
T1E12: The finale (vale ver a série toda que culmina nesse episódio super melancólico de Natal)

The Bear:
T2E6: Fishes (Um episódio isolado da trama da temporada que é uma odisseia de gatilhos em algo que é praticamente um filme sobre uma família difícil na festa de Natal)

séries britânicas

São uma categoria própria não por nada especial mas porque tem lá uma tradição de especiais de natal que podem ser só histórias isoladas ótimas como Doctor Who ou só algo pitoresco como Sherlock mas que também podem até matar personagens tipo Downton Abbey.

Doctor Who:
The Christmas Invasion (2005)
The Runaway Bride (2006)
Voyage of the Damned (2007)
The next doctor (2008)
End of time (2009)
A Christmas Carol (2010)
The Doctor, The Widow and the Wardrobe (2011)
The Snowmen (2012)
The time of the Doctor (2013)
Last Christmas (2014)
The Husbands of River Song (2015)
The Return of Doctor Mysterio (2016)
Twice upon a time (2017)
The church on Ruby Road (2023)

Downton Abey:
T2: Christmas at Downton Abbey
T3: A journey to the highlands
T4: The London season
T5: A Moorland Holiday
T6: The Finale

Sherlock:
The abominable bride (não é dos melhores episódios da série, mas é interessante por pegar a série contemporânea e fazer um episódio que é uma versão desses personagens no período “original” dos contos durante a Inglaterra vitoriana)

Misfits:
T2: Christmas Special

Black Mirror:
T2E4: White Christmas (odeio a série, mas esse é um episódio bem interessante)


MÚSICA

Só o que eu ouço em dezembro, amo músicas de Natal a ponto de ao longo dos anos ter montado uma playlist com mais de seis horas de duração no Spotify. Aqui. Mas também acho que vários álbuns maravilhosos surgem dessa época. Principalmente quando artistas trazem algo deles para as músicas e não simplesmente fazem covers. Aqui a nata do que tem de melhor de música de natal pra mim.

A jolly christmas, Frank Sinatra, 1957

The Andy Williams Christmas album, Andy Williams, 1963

A Christmas Gift for You from Phil Spector, coletânea, 1963

The beach boys christmas album, The Beach Boys, 1964

The Jackson 5 Christmas Album, Jackson Five, 1970

Feliz Navidad, José Feliciano, 1970

Merry Christmas, Mariah Carrey, 1994

25 de dezembro, Simone, 1995

One more drifter in the snow, Aimee Mann, 2006

A Christmas Cornucopia, Annie Lennox, 2010

A very she & him christmas, She & Him, 2011

Christmas, Michael Bublé, 2012

Everyday is Christmas, Sia, 2017


BÔNUS: LIVROS E VIDEOGAMES

Tá acabando! Mas esticando o tema até não dar mais, este último bloco traz alguns contos de natal que gosto muito (não li nenhum livro natalino por si). E também alguns jogos de videogame que se passam no natal ou tem fases natalinas.

livros / contos

Como o grinch roubou o Natal, Dr Seuss, 1957 Em inglês ou em português, um livrinho maravilhoso na sua construção divertida e bem musicada sobre esse personagem que odeia o natal e quer acabar com o feriado.

Um conto de Natal, Charles Dickens, 1843 Clássico absoluto natalino, deve ser o conto ou livro mais adaptado da história. Curiosamente também sobre um protagonista que abomina esse feriado e é visitado por fantasmas que assombram sua véspera de natal com realidades alternativas.

Sherlock Holmes| O Carbúnculo Azul, Arthur Conan Doyle, 1892 Lançado em revista na época mas presente na primeira coletânea de contos sobre Sherlock Holmes de Arthur Conan Doyle, é uma aventura que começa no dia seguinte ao Natal e envolve um ganso natalino e uma pedra preciosa roubada. Está em domínio público. Dá pra ler aqui. Blog ótimo onde eu li todas as aventuras do detetive enquanto fingia trabalhar numa metalúrgica em uma época triste da minha vida.

jogos

Hitman: Blood Money, 2006 Na sétima missão desse que é um dos jogos mais divertidos de Hitman, “you better watch out”, o Assassino 47 precisa assassinar um pornógrafo durante uma festa de Natal.

Batman: Arkham Origins, 2013 Admito que não cheguei nesse ainda, mas tendo jogado os dois primeiros jogos da série, Arkham Asylum e Arkham City, indico sem medo esta terceira parte que se passa anos antes do primeiro jogo. Em uma noite de véspera de Natal.

The Sims: 4 Estações, 2018 The Sims não tem um enredo por si e é basicamente um jogo onde você vive e faz o que quiser da vida dos personagens, mas para quem gosta de The Sims e gosta de Natal, vale considerar o pacote de expansão 4 Estações de 2018, que introduz fenômenos climáticos para complexificar a jogabilidade e traz com isso os feriados. Entre eles o Dia do floco de neve, onde as pessoas trocam presentes perto da lareira e é basicamente o Natal.

Spider-Man: Miles Morales, 2020 Este eu comecei faz pouco tempo, entrando aí na nova geração com um PS5, mas foi uma grata surpresa descobrir que esse spin off do segundo jogo do homem aranha, focado em Miles Morales, se passa no período Natalino. Inclusive com uma fase onde você precisa ajudar sua mãe a preparar a ceia. Mas vale mesmo para voar com a teia pelas ruas de um cenário que imita uma Nova York iluminada e coberta de neve.


Então é isso, gente. Vocês têm aí tanto conteúdo de natal que não vai dar tempo de ver, jogar, ouvir, ler, nem ao longo de um ano todo, quiçá durante os poucos dias restantes de dezembro. 

Mas a ideia é que a lista fique a qui para quem se interessar pelo tema. E também é algo que pretendo sempre continuar atualizando.

Um beijo e um abraço em todo mundo que acompanhou o Coquetel Kuleshov em 2023. Eu só tenho esse trabalhão e faço o que faço porque sei que tem alguém lendo do outro lado. Boas festas pra todo mundo e que o ano que vem seja melhor pra todo mundo.

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