Curioso que, ainda que Tony estivesse liderando esse encantamento da Scott Free com o digital nessa transição dos 1990s pros 2000s, Ridley também adote essa forma só que tenha sido esquecido em relação a isso. Mas ainda que a gente lembre mais dos filmes do outro em se tratando dessa combinação entre uma certa ‘sujeira’ inerente aos cenários onde os filmes se passam, Hannibal talvez seja o melhor exemplo de Ridley usando essa visualidade.
O que ele faz com Hannibal, uma franquia surpreendentemente dormente e que passou incólume pela década depois do celebradíssimo Silêncio dos Inocentes, é abraçar o tom mais exploratório e violento do personagem. Tudo acaba maximizado sob essas lentes da crueldade ao sangue à construção de Clarice como uma heroína.
É muito menos uma reflexão das personagens e muito mais um filme que parece consumido por uma certa cultura de novos slashers que existiam ao redor. Clarice é fodona; Hannibal é monstruoso enquanto até mesmo o seu falatório esnobe é superlativo; o “vilãozinho” de Ray Liota é o agente mais escroto do FBI; o corrupto italiano interpretado por Giancarlo Giannini tem o fim mais operístico dessa tragédia.
Faz sentido pensar que praticamente ninguém de “silêncio…” quis voltar. É outro mundo. Outro tipo de filme. Que ainda que funcione nessa chave de exploitation – com cenários chamativos e reviravoltas macarrônicas e aquela cena do cérebro… – é difícil pra quem vem do outro filme se readequar. Pensar nesse tema de outra forma.
Não por isso, o filme perde seus bons momentos. E também vale por essa curiosidade de como Ridley usa essa visualidade que une um ruído digital ao ambiente de sofisticação e decadência. Faz um bom par com Chamas da Vingança, se parar pra pensar em outro filme ‘irmão’ que também é inspirado numa obra de 10, 15 anos antes.
hannibal, eua, 2001
direção: ridley scott
roteiro: david mamet, steve zaillian
fotografia: john mathieson
montagem: pietro scalia
elenco: anthony hopkins julianne moore gary oldman ray liotta giancarlo giannini zeljko ivanek frankie faison francesca neri hazelle goodman david andrews francis guinan james opher enrico lo verso ivano marescotti fabrizio gifuni alex corrado marco greco robert rietti terry serpico boyd kestner peter shaw kent linville don mcmanus harold ginn ted koch william powell-blair aaron craig andrea piedimonte ennio coltorti mark margolis ajay naidu kelly piper judie aronson derrick simmons chuck jeffreys gano grills giannina facio renne gjoni roberta armani