Imperdoável é um filme que tem todas as peças certas no lugar errado e algumas delas ainda sobrando.
Essa que sobra, no caso, claramente é a ideia de que a história precisava de um segredo bem escondido para formar uma reviravolta. Com o objetivo de nos colocar ao lado de uma personagem que nós já defendemos sem o menor esforço a partir do momento em que ela é interpretada por Sandra Bullock. E também por causa da forte base de drama que inegavelmente existe aqui.
Fingscheidt lida muito bem com esse lado melodramático, aliás, como já fez com o surpreendente System Crasher/Transtorno Explosivo em 2019. Dá pra até dizer que esse filme quase consegue concretizar algo como uma continuação espiritual daquele. Porque nos põe na pele de uma personagem que tem dificuldade de lidar, confrontar e, mais ianda, controlar suas emoções e a forma como elas extrapolam em seu comportamento.
Os melhores momentos aqui vêm como as espirais de culpa dessa protagonista tentando reconstruir a vida depois de matar um policial. O que constrói uma narrativa que é de alguma forma sobre esse processo de reinserção social e sobre essa ideia repetida pelo agente de condicional dela de que pra sempre ela será definida pelos seus atos.
Em algum ponto, o filme vai sabotar isso por um processo de complicação. Vai deixar de explorar a questão de culpa e complexidade desse núcleo dramático e cair em uma reviravolta que tira as forças do drama simples que existia ali. E a personagem não será mais a complexa mulher que cometeu um erro porque a gente descobre que o erro foi um acerto e que a história não foi como imaginávamos.
O que no fim repete muito do problema principal aqui que é querer dobrar as apostas de drama e complicar o que não precisava ser complicado. Esvaindo a força da obra não pela falta mas pela diluição do que tem de melhor em outras tramas e aspectos que se tornam ruídos num filme que estaria muito bem sendo só uma construção de personagem. (e olha que eu nem citei a trama de suspense e vingança dos filhos do policial morto)
No todo, Nora acerta isoladamente em quase todas as cenas. Difícil encontrar algum erro de construção dos momentos, de decupagem, de desenrolar de sequências dramáticas. Mas falta o mais importante aqui, que é montar tudo isso de forma coesa e que nos mantenha investidos nesse desenrolar.
the unforgivable, eua, 2021
direção: nora fingscheidt
roteiro: peter craig, hillary seitz, sally wainwright courtenay miles
fotografia: guillermo navarro
montagem: joe walker stephan bechinger
elenco: sandra bullock viola davis vincent d’onofrio jon bernthal richard thomas linda emond aisling franciosi emma nelson will pullen tom guiry jessica mcleod rob morgan andrew francis w. earl brown orlando lucas jude wilson paul moniz de sa craig march alistair abell donavon stinson patti kim william belleau viv leacock toby hargrave bobbi charlton willy ross carolyn field joyanna tonge michelle choi-lee angela moore simon chin cynthia loewen sarah kelley kelly-ruth mercier flossie mcknight julie tao art kitching aaron pearl janet walmsley